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quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Entrevistas e “concurseiros” (João Soares Neto)



Quando estudante universitário – e até já formado – procurei fazer estágios/trabalhos e me submeti a provas escritas e a entrevistas, inclusive, para serviços a empresas locais, nacionais e até multinacionais que faziam pesquisas de seus mercados e de produtos. Embora o dinheiro fosse importante para ajudar a pagar o combustível ou a prestação do precário veículo que conseguira, sabe Deus como, comprar, valia a pena pelo jogo estabelecido entre entrevistadores – sempre tem mais de um – e entrevistado.
Tive ensejo de ficar sabendo como elaboram essas entrevistas com candidatos a trabalho, mesmo o temporário. A característica marcante dessa ação do entrevistador ou de um caça-talento (headhunter) é tentar interrompê-lo, fazê-lo sair do enredo que preparou para contar de suas habilidades pessoais ou profissionais. Assim, faziam perguntas que desconcertavam e nada tinham a ver com a habilidade requerida. Ouvi perguntas, por exemplo, desse tipo: você dança samba? Qual a sua música preferida? Onde fica Punta del Este? Quem descobriu o Brasil foi Américo Vespúcio ou Cristóvão Colombo? Como é o primeiro nome de Shakespeare? Quem escreveu “Os Sertões”? O que você faria se o seu carro desse um prego de gasolina à noite em cidade estranha? Machado de Assis fundou o quê? Cite um filme estrelado por Woody Allen? Quem foi Farias Brito? Por que o Brasil é uma República? Você sabe qual a raiz quadrada de 81? Qual o maior rio, o Nilo ou o Amazonas? Qual o resultado da multiplicação de 123456789 por zero? Virgínia Woolf nasceu em que país? O que é um Ford-T? Quem foi Monteiro Lobato? Vamos parar um pouco e dizer o porquê das lembranças das perguntas que ficaram. Eram instigantes, inusitadas, generalistas e tentavam desequilibrar o entrevistado, jovem mal iniciado que descobriu, desde então, ser especialista em generalidades, isto é, sabia um pouco de tudo, mas não sabia muito de quase nada. Outro detalhe: como os ambientes quase não possuíam refrigeração era singular o exame que faziam da sudorese do jovem na berlinda. Há bom tempo estou do outro lado da mesa. Ajudo a minha equipe a entrevistar profissionais de engenharia, arquitetura, administração, direito, informática, economia e contabilidade. Sempre temos vagas. De modo geral, além do conhecimento específico de cada atividade – o que é natural e indispensável mostrar na prova escrita – há carência de jovens profissionais que impressionem por linguagem clara (falam “tipo assim”), ter conversa com começo, meio e fim e rápida capacidade de raciocínio. Muitos jovens, independente das faculdades que fazem, viraram “concurseiros” e se obrigam a decorar matérias que, se aprovados na concorrência, pouco usarão no exercício da função pública desejada ou na que puderam passar. O emprego público é hoje o objeto do desejo de grande parte dos recém formados. Será o grande e ideal lugar para o jovem trabalhar?
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