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sexta-feira, 22 de março de 2013

Roteiro impossível para amores possíveis (Paulo Lima)




            1.
            A falação se alastrou pela cidade como fogo corredor. Mas era tudo verdade. Simeão, o homem mais baixo do povoado, um anão, se enamorou de Elisdete, uma mulher tão alta que parecia roçar o céu. Dia e noite, Simeão não parava de trabalhar, empenhado que estava em construir uma longa escada de madeira. As pessoas comentavam o objetivo dessa tarefa solitária. Simeão se valeria da escada para beijar Elisdete, quando pudessem por fim namorar.
           
            2.
        Valderez precisou percorrer duzentos quilômetros até Santa Cruz do Quero Quero. Andou a distância a pé, sob sol e chuva. Nesse meio tempo, as provisões que levava numa pequena bolsa se esgotaram. Com as habilidades de uma sertaneja, deu de caçar camaleões e sugar filetes de água dos mandacarus. Mas a provação valeu à pena. Valderez chegou finalmente à pequena cidade, e lá, no correio, postou uma carta de amor destinada ao marido que estava fora, sem dar notícias, fazia muitos anos.
            3.
         João Albuquerque seguiu de táxi para o aeroporto. À mulher, avisou que a reunião de negócios ocorreria num resort, numa estância hidromineral. Ele chegou ao aeroporto bem na hora do embarque. Dormiu a viagem inteira. No dia seguinte, já em Paris, foi ao encontro da amante, uma linda francesa 30 anos mais jovem, que fazia aniversário naquela data. Passaram o dia juntos. João Albuquerque voltou para o Brasil naquela mesma noite.  
            4.
            O bairro amanheceu tomado por um rebuliço. Sumira um diamante raro da casa de uma grã fina, e ela estava desconsolada, tamanha a raridade e o valor do objeto. Naturalmente, a polícia foi convocada. No local, além do óbvio estado de nervos da grã fina – e da família – havia um bilhete deixado pelo ladrão. Num pedaço de papel, ele dizia que o diamante era a única chance de conquistar o coração de uma dada mulher. E que devolveria a joia tão logo lograsse êxito.
            5.
            Felisberto tinha 98 anos e foi procurar um fisioterapeuta, sendo por este questionado se sentia algum tipo de dor. Afirmou que não; queria apenas lubrificar a engrenagem, pois carecia de usar a máquina de novo, como nos velhos tempos. Ante o espanto do médico, ele explicou seu caso. Estava tomado de amores por uma moça de 17 anos, e esta lhe fizera uma exigência. Felisberto tinha que levá-la a passear de bicicleta ao redor do parque da cidade.
            6.
            Naquela noite, Alda, uma mulher de 50 anos que ficara para titia, teve um sonho. Ela sonhou que um príncipe finalmente entrara em sua vida. Acordou feliz, uma felicidade transbordante, uma leveza na alma como há muito não sentia. Na noite seguinte, o príncipe retornou. Era tão real, era mais do que real, era um sonho. O príncipe continuou a visitá-la em seus idílios noturnos. Então, Alda tomou a decisão de não mais acordar. Assim poderia sonhar mais vezes com seu príncipe encantado.  

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